Antes do depois, de Bartolomeu Campos de Queirós

“Bartolomeu reinventa a vida pela escrita. E faz filosofia. Oferece ao leitor o prazer do espanto com a beleza que constrói com palavras. Faz suspirar, rir e lembrar afetos.” As palavras de Elizabeth Serra, secretária-geral da FNLIJ – Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil –, estão na contracapa do livro Antes do depois, de Bartolomeu Campos de Queirós. Experimente alguns trechos dessa consagrada prosa poética e assista ao depoimento de Elizabeth Serra sobre Bartô.

  

“Não sei se me recordo ou se é apenas uma vaga lembrança. Guardo uma quase certeza de que estive presente no meu batizado. Vi tudo. Não confirmo porque vão dizer que estou louco ou sonhando. Para muitos, enlouquecer e sonhar são defeitos. Desconhecem que só enlouquecemos ao não viver os sonhos. Afinal, o batizado era meu e não me custava estar presente. Jamais estaria ausente da minha primeira festa. Se eu não me lembro, também não quero esquecer.”

“Chovia no dia marcado. Minha mãe gostava de barulho de chuva no telhado, mas sem a chuva. Chuva é poema e pinga tristeza, lamentava. Uma lata no meio do corredor da minha casa amparava uma velha goteira. Quando era dia de sol, um raio fino passava pelo mesmo buraquinho e gotejava luz no assoalho. Luz não respeita escuros.”

“Lágrima é feita de água e sal. Isso mostra que existe um mar morando dentro da gente. Chorar é deixar o mar transbordar, eu fantasiava. Chorar é não querer morrer afogado. Chorar ajuda o mercuriocromo a curar mais depressa a ferida. Nunca perguntei à professora sobre as lágrimas. Tinha medo de escutar que a ‘ciência explicava’.”

 

“Ao nascer ganhei a liberdade, mas ser livre exigia muito pensamento. E pensar dava canseira demais. Foi aí que pequei pela segunda vez: a preguiça de ser livre. A preguiça aumentou meu capital. Ter de escolher dava muito trabalho. Hoje, quando vou ao restaurante, gosto sempre do que está no prato do outro. Não escolher é um alívio. Mas não há como viver sem escolher. Poder escolher é o melhor castigo. Na festa da escola declamei um poema de Alphonsus de Guimaraens. Agora, só sei um pedaço:

Quando Ismália enlouqueceu,
Pôs-se na torre a sonhar…
Viu uma lua no céu,
Viu outra lua no mar.”

 

 

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