Melhores Contos, de Edla van Steen

por Marco Severo *

O que torna um escritor um sucesso em termos de vendas ou de crítica será para sempre um mistério, por mais lúcidas que pareçam as teorias.

Edla van Steen é dessas que, seja quando publicam um livro de contos, um romance ou uma peça de teatro, chegam ao seu público com o que têm a dizer, mas que ainda não são amplamente reconhecidas como um tesouro da literatura brasileira. É como se estivessem em nichos.

Passeei pela coletânea Melhores Contos, publicada pela Global, e, findada a leitura, eu só gostaria de sair espalhando por aí o quanto Edla merece ser lida, o quanto deveria ser lida, por tudo que está tão vívido e iluminado nos seus escritos.

Ao longo de seus 23 contos espalhados em quase trezentas páginas, conhecemos os meandros humanos através das histórias que Edla tem para contar.

Suas histórias estão sempre ligadas ao desconforto de ser quem somos, ou ao questionamento que trazem as possibilidades de mudança. Ou como diz Antonio Carlos Secchin na apresentação da obra, “O narrador, em Edla, não se comisera de tantas vidas miúdas que a custo ousam lançar-se para além do perímetro da prudência que a si mesmos impuseram”. Está aí o humaníssimo ser humano que habita os contos da autora.

E quem há de dizer que na estrutura narrativa de Edla não cabe o aparente inusitado? Pois é o que temos no conto que abre a coletânea, “Mãe e Filho”, no qual uma mãe superprotetora tenta encaixar no mundo seu filho com grave disfunção mental, até que um golpe de sorte – o menino engravida uma garota – produz um casamento – e um final alentador para o, agora homem, Manfredo.

Em “Ela e ele”, uma mulher, já naquelas curvas da vida em que a perda de um amor quase implica a esperança de encontrar um novo, porque a vida já se esvai, atende o chamado de um ex de muitos anos atrás. Cheia de expectativa quanto a recuperar o amor do passado, ela primeiro se decepciona quando descobre que o real interesse do encontro é para que ela ceda a ele as cartas que lhe escreveu no passado, onde estão “suas verdadeiras poesias”. Com uma produção carente de algo novo, o escritor tem certeza de que a publicação das cartas colocarão novas luzes sobre sua obra. Superado esse conflito, ela se deixa levar para a cama – apenas para descobrir que um amor que passou não tem como ser ressuscitado.

Edla van Steen não busca chocar, como alguns de seus contemporâneos. Antes, a prosa da autora remete a Lygia Fagundes Telles e Nélida Piñon, com quem seguramente dialoga. São tramas que, se não impactam, surpreendem, e mesmo nos contos menos bons – não existe coletânea a salvo disso, sobretudo porque, em se tratando de diversidade, o que atinge um leitor pode não tocar outro –, quando o diálogo parece simples demais, ou por demais breve, a narrativa nos agarra com força. E há, claro, outros contos em que o diálogo é justamente onde se encontra o suporte narrativo.

A ficção de Edla procura aquele espaço entre aquilo que a vida já nos mostrou e portanto não pode nos tirar mais, e os lugares por onde almejamos navegar. Entre o que já foi e o que pode vir a ser, o que ela quer mesmo é evocar as emoções do leitor.

Que assim seja!

* Marco Severo é de Fortaleza, Ceará. Professor de inglês, tradutor, gosta mesmo é de escrever em português claro e de ler em todas as formas da língua. Autor dos livros Os escritores que eu matei (Editora Substância, 2015) e Todo naufrágio é também um lugar de chegada (Editora Moinhos, 2016).